Aqui, uma poesia da grande Ana Cristina César, que achei extraordinária!
FAGULHA
Abri curiosa o céu.
Assim, afastando de leve as cortinas.
Eu queria entrar,
coração ante coração, inteiriça
ou pelo menos mover-me um pouco,
com aquela parcimônia que
caracterizava as agitações me chamando
Eu queria até mesmo saber ver,
e num movimento redondo
como as ondas que me circundavam,
invisíveis,
abraçar com as retinas
cada pedacinho de matéria viva.
Eu queria
(só)
perceber o invislumbrável
no levíssimo que sobrevoava.
Eu queria
apanhar uma braçada
do infinito em luz
que a mim se misturava.
Eu queria
captar o impercebido
nos momentos mínimos
do espaço
nu e cheio
Eu queria
ao menos manter descerradas
as cortinas
na impossibilidade de tangê-las
Eu não sabia
que virar pelo avesso
era uma experiência mortal.
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