03 janeiro 2024

A Casa das Correntes de Ar

 

Outro dia meu primo, filho de uma das irmãs da minha mãe, me enviou um vídeo do sítio onde ele mora desde que nasceu, e onde eu e meu irmão passamos todas as férias da nossa infância e adolescência. Mostrou os legumes, frutas e verduras que plantou. Perguntei se aquela parte que aparecia no vídeo era a área atrás da casa, onde havia um grande pé de Seriguela, no qual, quando crianças, subíamos em seus galhos para brincar.

Sim. Era.  Pensei então, na casa. Grande, espaçosa, ventilada. Simples, sem luxo algum, preenchida com a alegria das crianças em férias, com o fogão de lenha na cozinha (que na minha infância ainda era ativo no preparo das refeições), com os tão esperados Natais, e com o lanche da tarde na cozinha, onde o doce de leite e o de abóbora nunca faltavam, e onde todos se sentavam para comer e conversar, fosse em volta da mesa ou nas cadeiras de espaldar alto que ladeavam as paredes.

Agora só resta meu primo naquela casa. E do lado de cá, somente eu restei. Pensar nisso me fez sentir um vazio imenso me envolvendo. Me veio novamente aquela sensação de flutuar solta no ar, desgarrada de tudo e de todos, sozinha, abandonada, como me senti durante um tempo após a morte da minha mãe. Vez ou outra, vem novamente me envolver essa sensação, como agora, pensando na casa do sítio da minha tia Ivone.

Da flutuação solta, sem rumo, senti em seguida, a vida como uma corrente de ar atravessando os cômodos daquela casa. Uma corrente de ar fugaz, ventilando tudo e depois cessando, deixando os cômodos somente preenchidos pelos móveis – inertes, ocupando seus espaços na casa e no tempo, olhando tudo, imóveis, sem voz, só existindo e observando o passar e o cessar das correntes de ar.

Cada um de nós foi uma corrente de ar que por lá passou. Agora só restam duas. Uma ainda habitando a casa, circulando por seus cômodos, fustigando os móveis, abrindo e fechando janelas e portas.

A outra está aqui, longe da casa das correntes de ar, escrevendo estas palavras e tentando não se perder nas flutuações que a atiram no vácuo, e nas lembranças de um tempo feliz.

19 dez 23

03 agosto 2019

Memórias Marilienses de Aventuras: Passeio em Guaimbê


Hoje, após dez anos, resolvi escrever mais uma Memória Mariliense de aventura. Uma colega de faculdade me pediu por whatsapp os outros textos que escrevi para ela ler para as filhas - fato que me deixou muito feliz e me despertou a vontade de escrever mais memórias. Embora elas tenham o meu ponto de vista e a expressão das minhas observações, não deixam de ser interessantes para os descendentes das amigas que as vivenciaram comigo.

Não tenho filhos e nem sobrinhos para mostra-las, não deixarei descendentes nesta passagem pelo planeta. Escrevo então para o universo (e para quem mais possa interessar), registrando como uma pegada no mundo cibernético (será publicado neste meu ainda vivo blog), as lembranças de uma época deliciosa que vivenciei nesta existência terrena.

O ano era 1993. No feriado de 21 de abril desse ano seria realizado o plebiscito nacional para decidir se o Brasil voltaria a ser uma monarquia ou não! (Acreditem se quiser). Nesse dia então, eu e umas colegas de faculdade resolvemos fazer um  outro passeio na região de Marília pedindo carona na estrada para nos locomovermos (o passeio anterior havia sido para Salto Grande, SP). Neste novo empreendimento as colegas parceiras da aventura foram:  Vera, colega de turma, Vilma, Adriana, e Valéria e seu namorado (com o qual ela se casou e está junto até hoje) – as três eram de uma turma seguinte à minha e da Vera.

A cidade escolhida foi Guaimbê – o motivo, sinceramente não me lembro. Talvez tenhamos sido atraídas por uma tal prainha que lá existia. E lá fomos nós neste feriado de 21 abril (quem pensaria que 24 anos depois eu também viveria uma aventura neste mesmo feriado? Dessa vez com o Grupo de Teatro Pepitos, rumo ao Festival de Teatro de Ubá-MG para apresentarmos a peça Nau dos Loucos, de Luís Alberto de Abreu, que acabou ganhando como melhor peça de comédia do festival) rumo à Guaimbê, na região de Marília.

Como de costume, fomos de carona na estrada. Fomos os seis para a BR e conseguimos dois veículos. Num deles entramos em quatro: eu, Vilma, Valéria e o namorado, no outro, Adriana e Vera. Chegamos a Guaimbê e conseguimos nos reunir os seis na praça central da cidade, de onde partimos à procura de uma agência dos correios para justificarmos nosso voto no plebiscito, já que estávamos fora de Marília. 

Após o voto justificado, procuramos a tal da prainha. Como chegamos lá, se a pé ou de carona, não me lembro, nem mesmo se era longe da cidade (isso aconteceu há 26 anos!). Mas me recordo que o lugar era realmente bonito. Havia uma parte alta com uma edificação que, se me recordo bem, abrigava uma cantina e talvez vestiários e sanitários. Na frente desse prédio havia um gramado onde sentamos para almoçar os lanches que levamos. Fizemos um delicioso pic nic com vista para a represa. Dos lanches, lembro-me somente da Valéria ter levado uma macarronada dentro de um grande e alto tuppeware. Comemos e ficamos por ali, apreciando o local e o belo dia que fazia. 

Abaixo do gramado existiam umas escadas que davam para a prainha, fomos até lá caminhar pela areia e molhar os pés na água. Haviam outras pessoas mas não estava lotada, o que tornava o local bastante agradável. Embora bonito, era um local simples, com pessoas simples, sem sofisticação alguma, mas para nós estava sendo um grande passeio, uma aventura empreendida entre amigos. E o meio que usamos para chegar lá – a controversa carona na estrada – tornava o passeio uma real aventura para ser contada para os filhos e netos.

Lá pelas 16h horas resolvemos que já era hora de partir, pois não queríamos enfrentar uma carona na estrada a noite. Ao sair da prainha – que na verdade era conhecida como Área de Lazer ou Balneário (uma busca hoje na internet me revelou isso), lembro-me que tivemos que andar a pé por um trecho um pouco longo numa estrada que passava em frente a esse local até alcançarmos a rodovia onde pediríamos as caronas para retornar a Marília. O retorno também se mostrou bem aventuresco, a começar por essa caminhada até a rodovia. E lá, já posicionados em petição de carona, aguardávamos ansiosos as boas almas que nos levariam para casa. Já eram 17h quando conseguimos que parassem dois carros simultaneamente. Nos dividimos em dois grupos de três pessoas e entramos nos carros. 

Chegamos em Marília já começando a escurecer. Lembro-me perfeitamente que o motorista pegou uma entrada para a cidade que eu ainda não conhecia, onde as casas exibiam em sua fachada umas pequenas placas onde se lia Casa de Família - o que achei na época bastante pitoresco. Fazendo um aparte, sinto não ter ”assuntado” o que ocorria naquele bairro – existiriam muitos bordéis na área? Desde quando? Quando as placas começaram a ser colocadas?

Não me recordo onde nossa carona nos deixou. Só me lembro que cheguei em casa bastante realizada e feliz pela pequena aventura vivida. Depois desse passeio, planejávamos passear em Londrina-PR, que ficava há umas duas horas de Marília –  de carona também – mas acabamos não concretizando o intento.

Essa foi minha última aventura mariliense na companhia incrível destas unespianas ousadas e malucas. No final do ano me formei e parti! 



Ribeirão Preto, 02/08/2019



27 março 2019

Encontro


Pelas minúsculas sardas da sua pele alva mapeei seu corpo.

De canto de olhos espiei sua mente.

Num repente singular, me perdi na cascata dos seus cabelos de fogo,
e por baixo deles, inusitadas tranças me receberam.

Despertados pelos seus beijos, meus sentidos se encantaram.

Guiou-me seu corpo esguio às águas profundas das concepções.

Confundindo-a com Freya, pensei que do encanto o amor viria,

Mas sereia que era, desapareceu ao amanhecer,

Restando o doce eflúvio de sua presença em meio às ideias perdidas.




26 e 27/03/2019

10 dezembro 2015

A Vida Sonhada dos Poetas






http://liviaportozoccoescritora.com.br/a-vida-sonhada-dos-poetas/ 

Ilustrações by Danieli Hautequest





A Vida Sonhada dos Poetas está disponível em formato Impresso (Clube de Autores),eBook (PDF ou ePub – Hotmart) e Kindle (Amazon).
 Todo o valor arrecadado com as vendas será revertido em doações à Protetores e ONGs de Ribeirão Preto que resgatam e cuidam de animais abandonados.

23 julho 2014

Aparição

Se aparecesses no meio da noite
Com teus cabelos revoltos
Teus olhos claros
E tuas tatuagens

Querer-te-ia com certeza
Sem receios ou remorsos
Quereria tua língua e 
Tua linguagem
Teu gosto e teu cheiro
Teu corpo e tua mente

Pois serias apenas mais um sonho
Como tantos que tenho sonhado
Sem consequências  quaisquer ou insistentes reticências

Mas se surges no meio do dia
Não posso querer-te, bem sabes.

À luz do dia teu amor não me responde, pondo-me em desconfortável  vereda,
Trilha que não quero seguir.
Descaminho...

Passos ao largo de ti.


Abril/14