17 janeiro 2011

Memórias Marilienses de "Aventuras": festa de casamento

O ano era 1993. Quarto ano de faculdade. As aventuras continuavam.

Um ano antes, eu e umas amigas-colegas de curso adquirimos o hábito, ou seja lá como isso possa ser denominado, de frequentarmos festas de casamentos sem sermos convidadas – ou seja - “penetrávamos” em festas alheias, especificamente de casamentos, do modo vulgarmente conhecido como “bicão”.

Nesse ano de 1993, conseguimos “descolar” uma festa muitíssimo interessante e promissora*.

Dada a divulgação boca à boca do nosso hábito ou hobby entre colegas, professores e pessoas com quem morávamos, passamos a obter informações sobre casamentos, as quais nos eram fornecidas sem termos de pedi-las. Talvez motivadas por um instinto de aventura enrustido, essas pessoas viam em nós, a concretização de seus sonhos aventurescos, os quais realizavam por nosso intermédio.

Bem, divagações filosóficas à parte, obtivemos informações sobre um determinado casamento aparentemente promissor por meio da dona do pensionato em que eu morava, a qual por sua vez, a obteve da dama de companhia de uma amiga.

Pois bem, eu e mais três amigas – duas das quais habitués da nossa prática do “bicão”, e a outra, estreante curiosa  - dirigimo-nos arrumadas e perfumadas, de ônibus, da Vila Altaneira (nosso quartel-general e local aonde moravam as duas primeiras) até a igreja Santo Antônio, localizada no bairro Alto Cafezal.

Lá chegando, começamos a assistir ao casamento. Como a cerimônia estava bastante demorada, resolvemos sair e caminhar até o local da recepção, que era bastante longe, pelo que me lembro. E, se não me falha a memória, a festa seria num salão pertencente aos bancários, lá para as "bandas" do final da av. Sampaio Vidal, sentido terminal rodoviário.

E lá fomos nós quatro a pé, rua afora. Após uns poucos quarteirões, uma das moças já não aguentava de dor nos pés devido a um sapato apertado. Como o caminho era longo, decidimos posicionar nossos polegares em prol da obtenção de uma providencial carona.

Alguns pouco minutos depois, uma perua kombi nos oferecia a carona. Entramos as quatro e, em meio a caixas com restos de verduras, e nenhum banco “sentável” à vista, nos acomodamos da melhor maneira possível, não sem antes informar ao motorista o nosso destino.

Chegando ao local da festa – que ainda se encontrava fechado – aproveitamos para discutirmos na calçada, a importante questão sobre qual desculpa usaríamos caso nos questionassem sobre quem éramos. Entre várias idéias, das quais infelizmente não me recordo, acabamos por escolher a mais sensata: eu diria que era sobrinha da Maria, que era a dama de companhia da amiga da dona do pensionato em que eu morava, pois ela estaria trabalhando na cozinha da festa! Achamos a idéia magnífica, e assim ficou decidido.
 
Aberto o salão, fomos as primeiras a entrar. Sentamo-nos numa estratégica mesa perto da cozinha. Os convidados foram chegando e se acomodando. A festa ia transcorrendo tranquilamente. Estávamos sendo bem servidas e, ao que tudo indicava, não havíamos suscitado suspeitas.

Quando demoravam para nos servir alguns dos deliciosos salgadinhos e demais iguarias, uma de nós se levantava e ia até a cozinha dar uma “reclamadinha” sobre a demora em sermos servidas. No mais, estávamos bastante satisfeitas com o transcorrer dos acontecimentos.

Algum tempo depois os noivos iniciam sua peregrinação pelas mesas dos convidados. O fato – já esperado – nos colocou em preocupante estado de alerta, que no entanto, já era nosso velho conhecido.

Sem escapatória, nos defrontamos com o momento fatídico: noivo e noiva, sorridentes e simpáticos chegam, sem qualquer desvio no percurso, à nossa mesa. Levantamo-nos as quatro – também sorridentes, e os cumprimentamos.

O noivo, simpaticíssimo, nos faz a crucial pergunta, enquanto transcorre rapidamente o olhar por nós: “Vocês são...”. Eu, incumbida de ser a “sobrinha da Maria”, conforme o combinado, seria a reveladora do fato: “Bom...", disse eu, trazendo a mão aberta em direção ao peito, "...meu nome é Lí...”.

Acreditem se quiserem, caros leitores, mas foi assim mesmo que aconteceu, conforme narro logo mais à frente, sem floreios, sem tirar nem por, sem aumentar um ponto sequer: como que por magia, encanto, ou seja lá o que for, fui interrompida na revelação de nossa identidade por uma voz que pronunciou: “Sidney!” Com o acento tônico no ney. Era o nome do noivo.

Um amigo do Sidney, cumprimentando-o efusivamente, fez com que o casal esquecesse completamente de nós, voltando sua atenção totalmente para ele.

Alívio nosso. E quem sabe, deles também!

Salvas pelo gongo e já bastante alimentadas, esperamos um pouco até que os três se afastassem e, discretamente, nos retiramos do salão.

Calçada ganha, às risadas nos demos – e aos comentários sobre nosso desempenho, sobre a sorte que tivemos e o apuro que passamos, curiosidade sobre o que a novata sentiu, sobre nossa amizade e, entre outras coisas, sobre esse maluco e ousado hobby que compartilhávamos e que nos unia.

E assim, felizes, fomos caminhando até o terminal urbano de ônibus para retornarmos à Vila Altaneira.


* Leia-se comida com boa qualidade e quantidade, e facilidade de penetração

Jan./2011